Crítica: Sex Education 4ª temporada

Saída de atores e desengajamento da série com a trama principal foram cruciais para o resultado insatisfatório da temporada

2/5
Oz
Data de publicação.
06/10/2023
8 min
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Opinião
Contém Spoiler

Sex Education chegou ao fim com sua 4ª temporada. A série, disponível para streaming na Netflix, vinha de uma sequência de três temporadas praticamente irretocáveis, com arcos de histórias interessantes, desenvolvimento claro de personagens e um fio condutor sólido, estabelecido através do relacionamento de Otis (Asa Butterfield) e Maeve (Emma Mackey) e também através da amizade entre Otis e Eric (Ncuti Gatwa).

O fio condutor, ingrediente mais importante da série, não esteve presente na season finale, em grande parte, devido às mudanças estabelecidas ao final da 3ª temporada. Além disso, outro fator importante que contribuiu com o péssimo desempenho da história da 4ª temporada foi o fechamento da Moordale Secondary School, que trouxe como consequência um novo palco para os personagens (Cavendish Sixth Form College) e um significante êxodo de atores (e consequentemente problemas no arco de outros personagens).

Não retornaram para a season finale: Ola Nyman (Patricia Allison), Lily Iglehart (Tanya Reynolds), Jakob Nyman (Mikael Persbrandt), Steve Morley (Chris Jenks), Anwar Bakshi (Chaneil Kular), Olivia Hanan (Simone Ashley), Rahim (Sami Outalbali) e Dex Thompson (Lino Facioli). Os professores Emily Sands (Rakhee Thakrar) e Colin Hendricks (Jim Howick) retornaram apenas para realizar uma pequena participação especial.

Vamos por partes.

Primeiro gostaria de esclarecer que as opções de roteiro estabelecidas ao final da 3ª temporada não foram de fato exclusivamente determinantes sobre o resultado desta temporada, e sim, a inabilidade do roteiro de Laurie Nunn (Radiance) em contornar esses percalços pré-estabelecidos e de concluir a série entregando um final satisfatório.

A ausência de Jakob, por exemplo, criou um buraco colossal no arco de Jean Milburn (Gillian Anderson), que nessa temporada se tornou uma mãe e uma profissional disfuncional. Jean não consegue fazer nada direito durante toda a temporada e essa é basicamente a única coisa que sua personagem faz. Para tentar tapar esse buraco, foram introduzidas duas personagens em seu núcleo: sua irmã Joanna (Lisa McGrillis) e sua nova chefe lésbica Celia (Hannah Gadsby).

Celia é uma personagem irrelevante para a história e Joanna é simplesmente insuportável. Apesar disso, é preciso destacar a cena em que Joanna liga para o programa de rádio de Jean (buscando ao mesmo tempo ajuda e reconciliação), que é de fato muito bonita.

Adam Groff é outro personagem que ficou literalmente avulso na série. Depois de se separar de Eric, havia sido sugerida uma aproximação entre ele e Rahim (que não retornou para a season finale) na temporada anterior. Sem Rahim (e sem Ola, sua única amiga), Adam acabou se aproximando forçadamente da única personagem de seu novo núcleo, sua nova chefe Jem (Bella Maclean).

O mesmo aconteceu com Aimee Gibbs (Aimee Lou Wood), que na ausência de sua melhor amiga Maeve e após terminar com seu namorado Steve, acabou se aproximando, também forçadamente, de Isaac Goodwin (George Robinson), outro personagem que ficou deslocado sem suas interações com Maeve.

Pobre da Ruby Matthews (Mimi Keene), que sem Anwar e Olivia ficou mais perdida do que cego em tiroteio. Sem ninguém para interagir, Ruby acabou sendo aglutinada ao núcleo de Otis. Com o afastamento de Otis (que ficou basicamente isolado nessa temporada), Ruby acabou auxiliando Courgette Connor (Conor Clarke McGrath) em uma campanha. Lembra dele? O masturbador que gostava da professora Emily Sands? Pois é. Taí um personagem que poderia não ter retornado.

Os arcos dos personagens de Jackson Marchetti (Kedar Williams-Stirling) e Cal Bowman (Dua Saleh) foram desinteressantes, com destaque para o arco de Cal, que foi particularmente enfadonho e mal escrito.

Michael Groff (Alistair Petrie), que na 3ª temporada teve um indício de estar retomando o controle de sua vida no episódio em que confrontou seu irmão bully, nessa temporada volta a ser inseguro, derrotado e atrapalhado, retornando a seu estado pós separação. Sem qualquer tipo de progressão a não ser a reconstrução seu relacionamento com seu filho Adam, Michael acaba reatando seu relacionamento com Maureen Groff (Samantha Spiro), que por acaso também estava avulsa na história. Após passar um tempo se aventurando de braço em braço, Maureen decidiu que sentia falta dele após uma constrangedora ligação de rádio. Simples assim. Até mesmo a amizade de Maureen com Jean foi completamente esquecida.

Nessa temporada, pouco ou quase nada foi mostrado sobre os professores da instituição, com exceção de Michael, que acabou indo lecionar na Cavendish. Ao invés disso, houve uma atenção especial ao movimento LGBT com a inclusão de inúmeros personagens queer, ao ponto de muitos deles não terem uma função aparente, estando na história apenas para reforçar um ponto.

Além disso, com a inclusão de vários personagens portadores de necessidades especiais, a 4ª temporada claramente foi pautada sob os padrões do movimento D.E.I. (diversidade, equidade e inclusão), o que não é uma coisa ruim, exceto quando utilizado em detrimento de uma história coesa, arcos bem escritos e divertidos e uma conclusão digna das primeiras três temporadas.

Ok, tirado isso do peito, vamos ao que interessa de verdade, ou deveria: Otis, Maeve e Eric.

Desde o começo da temporada, Otis, na ausência de Maeve e com o afastamento gradual de Eric, não possuía nenhum arco a ser percorrido. Ao invés disso, seu personagem ingressou em uma disputa incrivelmente infantil com outra personagem, Sarah ‘O’ Owens (Thaddea Graham), que também possuía uma clínica de terapia sexual na universidade.

A regressão de Otis foi tamanha que, além de suas intenções infantis, suas ações e trejeitos tentaram emular algo que ele deixou de ser a muito tempo: uma criança virgem atrapalhada e desconjuntada.

Quando Maeve retorna forçadamente, após um episódio em que seu professor a desencoraja a seguir a carreira de escritora, sua conexão com Otis é inexistente. Para reforçar essa desarmonia, Otis magicamente volta a ter problemas com seu passado, única e exclusivamente para não conseguir ter relações com Maeve, evidenciando a distância entre os dois.

É preciso destacar que, na vida real, nenhum professor de universidade olharia para um aluno e diria: desista que isso não é para você. Esse artifício foi utilizado porque o roteiro precisava atingir o ponto fraco de Maeve para fazê-la voltar, sua falta de autoestima, mesmo sem uma justificativa plausível.

Eric começou e ver, literalmente VER, Deus (ou Deusa). Depois desses “encontros divinos”, Eric despertou o interesse em seguir a carreira de pastor. E isso é tudo o que eu vou falar sobre o arco do personagem, que apesar desse disparate, tem seus bons momentos (como o do batizado).

A 4ª temporada de Sex Education é como um zumbi sem cabeça, continua andando, mas sem propósito e sem direção.

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03/01/2024