Antes de mais nada preciso confessar que sou fã de jogos e consoles ditos “retro” ou “vintage”. Para mim, não devem nada para seus parentes contemporâneos. É claro que existem diferenças enormes, porém, são elas que os tornam especialmente atraentes e cativantes.
Detona Ralph (Wreck-It Ralph no original) é uma animação que mostra o que acontece com os personagens dos jogos quando ninguém está olhando, lembrando, um pouquinho que seja, os filmes da franquia Toy Story. Sua temática gira em torno da auto descoberta e da amizade.
O filme, dirigido por Rich Moore, que até então só era conhecido por seu trabalho em alguns desenhos como Futurama e Os Simpsons, é muito bem conduzido e dosado. Possui tudo aquilo que você quer ver em um filme.
Ralph é o vilão do jogo de fliperama Conserta Felix Jr (Fix-It Felix Jr) e que, cansado de ser sempre excluído mesmo após o fim de seu expediente, resolve fazer algo à respeito para ganhar os mesmos méritos e reconhecimento que o mocinho Felix Jr (na voz de Jack McBrayer e dublado por Rafael Cortez na versão nacional). No dia em que comemoraria o 30º aniversário de seu jogo, Ralph abre seu coração na reunião dos Vilões Anônimos cujo lema é “um jogo de cada vez”.
Nessa reunião somos apresentados aos primeiros easter eggs do mundo dos games que o filme se propõem a mostrar, com a presença de personagens conhecidos como M. Bison e Zangief do jogo Street Fighter, Kano e Smoke do jogo Mortal Kombat e muitos outros.
Se você é um gamer então provavelmente ficará feliz com as demais referências de personagens ou menções de jogos que o filme traz consigo: Ken, Ryu, Cammy e Chun-Li (também do Street Fighter), Space Invaders, Asteroids, Tartarugas Ninja, Lara Croft, Beholder (Dungeons & Dragons), Sonic, Dr. Robotinik, Cyril (o zumbi de House of the Dead), Neff (o demônio rinoceronte de Altered Beast), Bowser ou Koopa, Mario, Final Fantasy VII (na pichação “Aerith lives”, referência a Aerith), Frogger, Tapper ou Root Beer Tapper, World of Warcraft (na pichação “Jenkins”, referência ao vídeo de um jogador famoso chamado Leeroy Jenkins, que teria ignorado a estratégia de seu grupo, lançando-se loucamente em combate e dessa forma fazendo com que seu grupo fosse massacrado), Metal Gear (a exclamação vermelha) e Star Wars (na máquina de fliperama e na respiração estilo Darth Vader que Ralph faz ao esconder-se debaixo d’água para fugir dos policiais que o perseguiam).
O joystick do famoso Nintendo 8-bits, ou Nintendinho, pode ser visto quando o Rei Doce (King Candy) executa uma seqüência de comandos conhecida como Konami Code, que nada mais é do que um cheat que pode ser usado em vários jogos da Konami para habilitar alguma opção secreta.
Existem ainda duas referências que eu gostaria de destacar por puro saudosismo, são elas: Pac-Man/Clyde (Clyde faz parte, juntamente com Blinky, Pinky e Inky, do quarteto de fantasmas, ou Galaxians, do jogo Pac-Man) e Q*Bert. Se você tem mais de 30 anos e já teve contato com consoles como o Atari e o Odyssey então você sabe exatamente do que eu estou falando.
Ainda hoje sou um feliz proprietário de um antigo (porém não menos divertido) Odyssey e de jogos como Q*Bert, Come-Come! e Come-Come II. Além de consoles e jogos mais “modernos” como o Super Nintendo e seus cartuchos Street Fighter, Mortal Kombat, Super Mario World e por aí vai. Resultado: não tive como ficar imune a estas queridas participações especiais.
Referências à parte, Ralph (na voz de John C. Reilly e dublado por Tiago Abravanel na versão nacional), desafiado por Gene, um dos personagens de seu jogo, parte em uma aventura rumo à medalha que, segundo ele, irá mudar a forma com que todos o vêem. É aí que a história se desenrola.
Apesar de seu jeitão truculento, Ralph (não dá pra deixar de lado a comparação com o famoso ogro Shrek) é um personagem cativante e de bom coração. Em seu caminho surgem outros dois personagens de igual importância para a trama: Vanellope Von Schweetz e a durona Calhoun (voz de Jane Lynch, conhecida por sua personagem Sue Sylvester da série Glee).
Condensando o lado emocional do filme está a excelente trilha sonora, que potencializa os passagens mais marcantes, criando em sua volta uma atmosfera que envolve o expectador. Destaca-se nos momentos necessários sem exageros. Os temas que emulam jogos 8-bits são criativos e divertidos.
Totalmente fora de sintonia com a obra, ao meu ver, é a voz da personagem Vanellope (Sarah Silverman no original estadunidense e Marimoon no Brasil), caracterizando-se, portanto, como um dos pontos fracos do filme. A dubladora tenta, sem sucesso, simular a voz de uma garotinha descolada, porém, o resultado é uma voz rouca e forçada que vai irritando conforme o filme avança. Esquecendo o detalhe da voz da personagem, os tilts, ou como ela mesmo diz, a “pixelexia”, são artifícios utilizados inteligentemente pelos roteiristas, que aproveitaram os famosos bugs recorrentes dos jogos, principalmente dos mais antigos.
É preciso ressaltar a qualidade das texturas do filme, especialmente nas utilizadas dentro do jogo Corrida Doce (Sugar Rush). Repare as jujubas e as bolas de sorvete!
A Estação Central de Jogos (filtro de linha) é uma ótima sacada, servindo como ponto de encontro para todos os personagens dos fliperamas da Lit Wak’s – Family Fun Center (simulando uma grande estação de metrô). Seus trilhos são a representação da fiação das máquinas de fliperama e os portais de embarque são as tomadas do filtro de linha.
Outra passagem interessante do filme caracteriza-se na apresentação, de forma simultânea, das perspectivas do jogador e dos personagens do jogo em Missão de Herói (Heroes Duty, o jogo First Person Shooter da personagem Calhoun).
Bem amarrado e cheio de referências inteligentes, o roteiro é muito bem trabalhado. A forma com que o vilão é apresentado traz a reviravolta necessária para guiar o terceiro arco do filme, que combina bem humor, drama, ação, romance, amizade, generosidade e sacrifício.
Com direito à um catártico climax, Detona Ralph é um filme que personifica a palavra entretenimento e vai surpreender até mesmo os cinéfilos menos entusiastas de games, animações e filmes infantis.